A soberba e os cacos de estrelas

A soberba e os cacos de estrelas

Havia uma linda estrela no céu. Em meio às demais, à lua e aos astros que a rodeavam, a pequena estrela se destacava pela beleza do seu brilhar. Ao menos era o que ela achava. Por ser tão linda e maravilhosa, revestida de inúmeros caquinhos cintilantes, além de muito vaidosa, a estrelinha decidiu que deveria se mudar para um local mais adequado. Onde estava, a luz da lua e das outras estrelas ofuscava seu esplendor; seria necessário brilhar sozinha em meio ao breu de um lugar distante. A estrelinha carregou suas trouxas e partiu para a sua viagem. No meio do caminho, alguns poucos vaga-lumes e mariposas conversavam entre si e admiravam a beleza da estrelinha. Chegavam a indagar: – “Mas é a mais linda de todas. Mais brilhante que a própria lua”. Outros reconheciam que na verdade a pequena não se aproximava de forma alguma da magnificência do satélite natural. Até cochichavam: – “Lá vai a chata, que não tem amigos e se acha melhor que os outros”. Pelo jeito, poucos gostavam da estrelinha. Ela, por sua vez, admirava-se em ver inúmeras estrelinhas brilhantes no caminho, ajudando umas às outras em suas tarefas. Sempre foi solitária e não precisaria de ninguém, pois era auto-suficiente em seu brilho. Ao chegar ao seu destino, a estrelinha passou a brilhar como nunca anteriormente. Sua luz iluminava todos os cantos dos céus, pois não havia outra luz que ofuscasse a sua própria. No entanto, algo inesperado aconteceu. Ela ouviu um som, como que de algo quebrando. Ela sentiu que uma de suas pontas rachou. Em seguida, novos sons foram ocorrendo e mais e mais cacos apareciam. A pequena estrela começou a se desesperar, por estar longe de tudo e de todos, sem ninguém para ajudá-la, e já sem seu brilho inicial. O tempo passou e ela chorava e lamentava. Até que um vaga-lume passou pelo local e reconheceu a pobre estrela. Em um diálogo difícil, o inseto repreendeu a estrelinha, por ter se afastado dos demais e por ser tão egoísta e vaidosa. Num ato de bondade, o vaga-lume chamou seus amigos, que ajudaram a consertar as feridas da pequena cintilante. Ela voltou para casa e reconheceu que era necessário brilhar ao lado da lua e dos demais astros. Que não precisaria se impor, mas que seu brilho seria reconhecido automaticamente pelos demais, que agora já eram seus amigos.

Esse pequeno texto resumo o livro infantil que deu título ao meu blog: Cacos de Estrelas. Ganhei em uma ocasião muito especial e até hoje essa estória mexe comigo. Trata justamente do assunto do primeiro pecado da série: a soberba. Há inúmeros sentimentos e atitudes que estão atrelados à soberba. Temos o orgulho, a vaidade, o egoísmo. Todos eles estão, de alguma forma, relacionados a esse pecado, que foi provavelmente o primeiro passo de desobediência contra Deus. Quando Satanás decidiu criar um reino próprio e se rebelar contra o Senhor, sua provável atitude foi de soberba, querendo tomar o lugar de Rei nos céus. É um pecado, uma transgressão que está diretamente relacionada ao “eu”, à adoração própria e a um forte sentimento de insegurança e orgulho.

Na estorinha contada acima, a estrelinha é um ser soberbo. Ela entende que seu brilho é especial e se acha superior às demais. Apesar de, na realidade, brilhar tanto quanto qualquer outra delas – e potencialmente menos que a Lua -, a pequena estrela mantém uma aparência de vaidade e superioridade. A soberba é um pecado que pode atingir qualquer pessoa. Ninguém está livre de agir com soberba diante dos demais. Quem nunca achou seu brinquedo melhor que o dos demais? Ou se achou o máximo por ter tirado a melhor nota da turma? Apesar de vivermos momentos de orgulho, viver em constante soberba é algo diferente e mais profundo.

Um dos mais interessantes exemplos bíblicos encontra-se em Lucas 18.9-14. Em resumo, a parábola conta a história de dois homens. Um deles, o fariseu, representava uma classe de santos e respeitáveis dentre os crentes em Deus. O outro, em contrapartida, representava um simples trabalhador. Ambos estavam orando, porém de formas distintas. Enquanto que o fariseu se auto-declarava um homem bom e temente a Deus, o publicano se humilhava e confirmava ser digno de misericórdia e perdão. O grande erro do primeiro, foi ter se comparado ao último: “não sou (…) nem mesmo como este publicano” (v. 11). Ao se utilizar de uma falsa piedade e humildade, o fariseu jogou à luz toda a soberba que havia em seu coração, além de uma insegurança enorme com relação ao que era, pois necessitou humilhar o seu companheiro para poder sentir-se com valor.

Talvez o grande vilão da soberba seja justamente a insegurança que existe no coração das pessoas. É muito fácil manter as aparências em um altar de soberba, criando assim um alto senso de valor próprio. Quanto mais inseguros somos de nós mesmos, maior é nossa tendência em olhar para nossos próximos com a intenção de encontrar falhas neles que não encontramos em nós mesmos. É relativamente prazeroso olhar para alguém que adulterou e saber que “jamais faria isso”. Quando meus pecados parecem pequenos ao serem comparados aos dos que estão ao meu redor, sinto-me mais valioso e menos pecador. Isso me leva ao próximo degrau em direção à soberba. E nesse ponto estamos nos enganando e sendo levados por um pecado que pode nos isolar e nos levar a um estágio crítico de dor e ansiedade.

Graham Tomlin, em seu livro “Os sete pecados capitais”, conta a seguinte estória:

“Conta-se a velha história de um homem que teve um sonho. No sonho, ele foi ao inferno, que consistia em uma sala com uma grande mesa no centro. Sentados em torno da mesa estavam muitos convidados, e a mesa estava abarrotada de todos os tipos de comidas deliciosas; porém, os convidados estavam irritados, infelizes e famintos, e um silêncio sombrio pairava sobre a sala. Enquanto observava, o homem descobriu a razão. Cada um deles estava sentado muito longe da mesa de modo que não podia alcançá-la, por isso todos haviam recebido uma colher muito longa. No entanto, embora pudesse agora pegar a comida, a colher era longa demais para a colocarem na boca. Por isso, todos passavam fome. O homem, em seguida, foi levado ao céu, onde, para sua surpresa, a mesma cena se repetiu. Contudo, aqui, havia riso, alegria e conversa animadas. Enquanto observava, ele logo entendeu por quê. Aqui, em vez de tentar levar a colher longa à boca, cada pessoa havia aprendido a usá-la para dar de comer à pessoa que estivesse sentada um pouco mais longe. Desse modo, todos comiam e ficavam felizes.” (p. 48)

A pequena parábola mostra a diferença sutil entre ser e não ser soberbo. Em ambos os casos, as circunstâncias eram semelhantes. A diferença estava na forma como ela fora encarada. Isto é, o soberbo tem a chance de se humilhar e servir ao seu próximo, assim como fizeram no céu, ou de negar o trabalho e, então, passar fome. Para nos tornarmos humildes, precisamos primeiramente aprender a olhar para Deus. Jesus, apesar de ser Deus, não usurpou Seu lugar (ver Filipenses 2). Durante toda a Sua caminhada, embora houvessem motivos aparentes para que se tornasse um ser humano soberbo, Jesus jamais deu lugar ao orgulho, humilhando-se em diversas situações (ver João 13).

Vencendo a soberba

É possível vencer esse pecado. Tornar-se humilde é diferente de se transformar em um santo cheio de auto-piedade. Humildade não necessariamente diz que somos inúteis ou que devemos morrer, mas nos faz pensar menos em nós mesmos e mais nos outros. Para nos tornarmos mais humildes, são necessárias algumas atitudes. A primeira delas é reconhecer sua natureza pecadora diante de Deus e de todos os homens. Humilhe-se diante do Pai e mostre a Ele sua vulnerabilidade. Outra dica, presente no livro de Tomlin, é a confissão. Quando confessamos a Deus e ao nosso próximo os nossos pecados, expomos nossa natureza falha e somos obrigados a nos humilharmos. A terceira e última disciplina é o serviço. Ao servirmos às pessoas que estão ao nosso redor, embora contrário ao senso comum humano, passamos a criar um senso de valor real para nós mesmos e para o próximo. Ao servir, estamos pensando menos em nós e mais naquele que recebe nosso favor.

A soberba pode crescer e frutificar. Se não for devidamente colocada em seu lugar, pode nos levar a um pecado terrível, a inveja. Oro para que Deus esteja cuidando de cada um de nós e nos livrando desses pecados carnais. Nos vemos semana que vem!